quarta-feira, 14 de abril de 2010

Lygia Fagundes




Nascida em São Paulo, no bairro de Santa Cecília, em 19 de abril de 1923, Lygia Fagundes Telles foi a terceira mulher a tomar posse na Academia Brasileira de Letras. Eleita em 24 de outubro de 1985 para suceder Pedro Calmon, a escritora tomou posse em 12 de maio de 1987 e ocupa a cadeira número 16.


Lygia Fagundes Telles passou seus primeiros anos da infância mudando-se constantemente, já que seu pai era promotor público. Morou em várias cidades do interior e, em 1931, já alfabetizada, escrevia nas últimas páginas de seus cadernos escolares as histórias que mais tarde iria contar em rodas domésticas.

Iniciou sua carreira como escritora – inicialmente como contista – em 1938, quando publicou Porão e Sobrado, reunião de 12 contos. Seu primeiro livro foi financiado por seu pai.

No ano seguinte, termina o curso fundamental no Instituto de Educação Caetano de Campos, na capital paulista.

Ingressa em 1940 na Escola Superior de Educação Física, também em São Paulo. Ao mesmo tempo, freqüenta o curso pré-jurídico – curso preparatório para a Faculdade de Direito do Largo de São Francisco.
Em 1941, mesmo ano em que conclui o curso de Educação Física, Lygia Fagundes inicia o curso de Direito e passa a freqüentar as rodas literárias que aconteciam em restaurantes, cafés e livrarias próximas à faculdade. Conhece Mario e Oswald de Andrade, e Paulo Emílio Salles Gomes, entre outros intelectuais da época. Nesse período, integra a Academia de Letras da faculdade e colabora com os jornais acadêmicos A Arcádia e A Balança.
Publica em 1944, Praia viva, sua segunda coletânea de contos. Três anos depois, conclui o curso de Direito. Em 1949, publica seu terceiro livro de contos, O cacto vermelho, pelo qual recebe o Prêmio Afonso Arinos da Academia Brasileira de Letras. Apesar do sucesso de seus primeiros trabalhos, Lygia Fagundes não os reedita mais, pois os considera superados, meros exercícios literários.
 
Em 1950, a escritora casa-se com o jurista Goffredo da Silva Telles Júnior, na época deputado federal. Muda-se então para o Rio de Janeiro. Retorna à capital paulista em 1952, quando começa a escrever seu primeiro romance, intitulado Ciranda de pedra, publicado em 1954, ano em que nasce seu filho Goffredo da Silva Telles Neto.


Separa-se do marido em 1960. No ano seguinte, começa a trabalhar como procuradora do Instituto de Previdência do Estado de São Paulo.
Em 1963, publica seu segundo romance, Verão no aquário. Casa-se com Paulo Emílio Salles Gomes – professor, escritor e fundador da Cinemateca Brasileira.
Em 1967, a convite do cineasta Paulo César Sarraceni, e em parceria com Salles Gomes, Lygia Fagundes faz a adaptação para o cinema do romance Dom Casmurro, de Machado de Assis. O trabalho de adaptação foi publicado em 1993, sob o título de Capitu.
 
A ficção de Lygia Fagundes Telles possui características do período conhecido como Pós-45. Alguns estudiosos defendem que sua obra pertence à Geração de 45 – denominação dada a um grupo de escritores, especialmente poetas, que surgiram na literatura brasileira na década de 1940, cuja atitude estética foi a de reagir contra o clima da primeira fase modernista. Contudo, o caráter ficcional de sua obra sintoniza com o existencialismo - vertente cultural da época - além de correntes literárias como o expressionismo e o surrealismo. A escritora, porém, sempre acompanhou as mudanças existenciais, políticas e sociais que ocorreram ao longo de sua carreira.
Sua obra versa sobre as experiências humanas, sobretudo as experiências interiores.

É através da solidão – drama particular da maioria de seus personagens – que ela nos apresenta, através da análise dos sentimentos e das percepções de suas personagens, o conflito entre o mundo objetivo e o subjetivo, o real e o ideal. A autora utiliza monólogos interiores – recurso estilístico paraliterário, também chamado fluxo de consciência - como fonte de conhecimento das personagens. O desenrolar das tramas é estruturado em detalhes calculados, deixando em cada gesto marcas de uma personalidade ou de uma situação. A configuração física do ambiente nos enredos é secundária, o foco é a posição interna assumida pelas personagens diante dos episódios.

É assim em Ciranda de pedra, primeiro romance da autora. Virginia, personagem principal, é uma garota solitária, filha de pais separados. Após a separação dos pais, vai morar com sua mãe, que logo adoece. Virgínia passa a morar com os pais e as duas irmãs, num ambiente movimentado e hostil. O nome que dá título ao livro refere-se a uma roda de anões de pedra que ornamenta o jardim da casa, ciranda da qual Virgínia não pode participar. A ciranda de pedra representa simbolicamente o mundo interior da personagem e encerra o núcleo do tema: o sentimento de rejeição.

O tema da rejeição está presente também em O verão no aquário, segundo romance da autora, onde o centro das tensões também é a família. O foco dessa análise psicológica profunda está sempre nas personagens femininas. As personagens masculinas da literatura de Lygia Fagundes Telles são, geralmente, representantes simbólicos de funções sociais ou de poder, riqueza e status, não possuindo contornos marcantes como as femininas.

Engajada politicamente, a escritora sempre deixou clara a sua preocupação em relação às questões políticas e sociais e ao papel do escritor enquanto formador de opinião. Sobre o ato do escritor de escrever sobre seu tempo, Lygia Fagundes Telles, em entrevista à revista Cult, de junho de 1999, diz:
“Antes de mais nada, eu queria dizer que acho intolerável conviver com estas estatísticas que dizem que há três milhões de crianças sem escola, cavando, plantando para levar uma miserável contribuição para a família (...).

Acho isso intolerável. Assim, espero que se faça justiça ao grupo de escritores – alguns, da minha geração – que participou de verdadeiras cruzadas em favor da educação e da cultura. (...)

Sim, existe um certo silêncio de perplexidade, como se nos faltasse o chão. Mas e o silêncio dos políticos que falam, falam e não dizem?

Que se faça justiça a esse grupo do qual participei, foi um alerta. Era como se estivéssemos adivinhando o que iria acontecer, a violência e a boçalidade desse país nascem da ignorância. (...)

Machado de Assis, aquele gênio mestiço que veio do morro, costumava dizer que o nosso povo, o povo real, o povo verdadeiro, esse era bom. Perigoso era o chamado oficial... Creio que sempre tive essa preocupação ética, a difícil condição humana num planeta enfermo.”

Tema de numerosos artigos, ensaios e trabalhos acadêmicos, Lygia Fagundes Telles configurou-se como um grande sucesso de público e de crítica, tendo suas obras traduzidas para o alemão, espanhol, francês, inglês, italiano, polonês, sueco, tcheco e adaptadas no Brasil para o cinema, teatro e TV. Teve suas obras publicadas também em Portugal, onde é correspondente desde 1987 da Academia de Ciências de Lisboa.


Em 2001, a escritora recebeu o Prêmio Jabuti, o prêmio Golfinho de Ouro e o Grande Prêmio da Associação Paulista dos Críticos de Arte pelo livro Invenção e memória, publicado em 2000. No mesmo ano, a autora é agraciada com o título de Doutora Honoris Causa pela Universidade de Brasília (UnB).

Lygia Fagundes Telles foi tema da série O escritor por ele mesmo, de 1997, e do quinto número dos CADERNOS DE LITERATURA BRASILEIRA em 1998, publicações do Instituto Moreira Salles. Sua coleção particular foi incorporada ao IMS em outubro de 2004 e é formada por mais de mil itens, entre livros, periódicos, artigos e vídeos, além de prêmios, medalhas, placas comemorativas e a máquina de escrever da autora.
A escritora foi eleita em 2004 pela Revista Forbes Brasil a mulher mais influente do Brasil na área literária. Em 2005, recebeu o Prêmio Camões, o mais importante prêmio da literatura em língua portuguesa.


Outros livros de contos de Lygia Fagundes Telles:
• Histórias do desencontro, 1958;

• Histórias escolhidas, 1964;

• O jardim selvagem, 1965;

• Filhos pródigos, 1978 (republicado a partir de 1991 sob o título A estrutura da bolha de sabão);

• A disciplina do amor, 1980;

• Mistérios, 1981;

• Durante aquele estranho chá: perdidos e achados, 2002;

• Meus contos preferidos, 2004;

• Histórias de mistério, 2004;

• Meus contos esquecidos, 2005;

• Conspiração de nuvens, 2007.



Romances de Lygia Fagundes Telles:

• Ciranda de pedra, 1954;

• Verão no aquário, 1963;

• As meninas, 1973;

• As horas nuas, 1989.



Outros prêmios a Lygia Fagundes Telles

• Prêmio Instituto Nacional do Livro pelo livro de contos Histórias do desencontro, de 1958.

• Grande Prêmio Internacional Feminino para Estrangeiros (França), com o livro de contos Antes do baile, publicado em 1970.


Referência


http://www.academia.org.br
http://www.acad-ciencias.pt/academicos/lftelles.html

INSTITUTO MOREIRA SALLES. CADERNOS DE LITERATURA BRASILEIRA, n. 5: Lygia Fagundes Telles. São Paulo: IMS, 1998.

INSTITUTO MOREIRA SALLES. O escritor por ele mesmo: Lygia Fagundes Telles. São Paulo: IMS, 1997.

MOISÉS, Massaud. Dicionário de termos literários. São Paulo: Cultrix, 1974.

OLIVEIRA, Kátia. A técnica narrativa em Lygia Fagundes Telles. Porto Alegre: Universidade Federal do Rio Grande do Sul, 1972.

Revista Cult, n. 23, jun., 1999.

Revista Forbes Brasil, 03.12.2004.
Pesquisa: Maria Inês Rivaben Ricci e Maria Paula Galdino Miyashiro

Texto: Maria Paula Galdino Miyashiro

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Deixe um comentário, sua opinião é muito importante.